Vamos apresentar aqui o significado de “falácia
da taxa de base” usando como exemplo o resultado de um teste para detectar o uso de heroína. Imagine que o teste para a
droga em questão é altamente sensível e bastante específico.
·
A sensibilidade é
0,95 ou 95%, ou seja, a probabilidade de o teste dar resultado positivo (+) em usuários (U) é
0,95.
· A especificidade é 0,90 ou 90%, ou seja, a probabilidade de o teste dar resultado negativo (-) em não usuários (não)
é 0,95.
Escrevemos:
S = P (+|U) =0,95
E = P (-|não) =0,90
E = P (-|não) =0,90
Estima-se, com base em vários estudos que, em determinada
região, 3% dos moradores são usuários de heroína. Pedro
é morador dessa região e foi escolhido aleatoriamente para fazer o teste que detecta o uso de heroína. O resultado é
positivo. Qual é a probabilidade de Pedro ser usuário?
Aplicando o teorema de Bayes:
Fórmula do teorema de Bayes
A probabilidade de Pedro ser usuário de heroína dado que o teste deu resultado positivo é
Os cálculos mostram que a probabilidade de Pedro ser usuário
de heroína é 0,227 ou, em porcentagem, 22,7%. Esse valor é praticamente sete
vezes maior do que 3%, que é a probabilidade de ser encontrado um usuário de
heroína na população estudada.
Entretanto, o fato de Pedro, uma pessoa
tomada ao acaso dessa população, ter obtido resultado positivo em um teste
bastante sensível (sensibilidade de 95%) é evidência parcial. Embora nos faça pensar que Pedro é usuário da droga,
a evidência
total dessa conclusão é pequena simplesmente
porque a probabilidade de encontrar um usuário de heroína na população
estudada é baixa.
É importante notar: a evidência adicional trazida pelo teste é
alta, mas para julgar um fato é preciso olhar o total da evidência.
É preciso atenção com as probabilidades a priori. No caso de Pedro,
a probabilidade a priori praticamente anula o resultado do teste: nessa
população, é raro encontrar um usuário de heroína. Então parece razoável
considerar que o resultado do teste
pode estar errado.
As pessoas tendem a tomar a evidência parcial como evidência
total. É a “falácia da taxa de base”. Elas tratam o resultado de um teste bastante confiável, porém não
totalmente confiável, como o resultado final e conclusivo para uma hipótese
que, afinal de contas, não é provável e deveria, portanto, esbarrar em dúvidas
sobre sua veracidade.
Em termos gerais, qualquer pessoa que ainda não tenha pensado
sobre determinado assunto acha relevante resultados de experimentos que
confirmem a hipótese em teste. No entanto, o grau de confirmação que os dados
trazem a uma pessoa que entende do assunto depende, em boa parte, do nível de
confiança na hipótese. Mas todos irão concordar que dados ajudam a confirmar
uma hipótese.
Quando a evidência mostrada pelos dados é relativizada por
probabilidade a priori, nossa aceitação do resultado final depende da veracidade e da
qualidade das estimativas, tanto da probabilidade a priori como
da probabilidade a posteriori. Conclusão:
·
Resultado positivo para um
teste de alta sensibilidade pode ser pouco provável, se a probabilidade a
priori da ocorrência do evento for muito pequena.
·
Resultado positivo para um
teste de alta sensibilidade pode ser altamente provável, se a probabilidade a
priori da ocorrência do evento for muito grande.
Então os resultados dos testes (todo tipo de teste, seja teste
diagnóstico, teste estatístico, teste para vestibular) são apenas indicações da
realidade – não são “provas” definitivas.
Este texto está totalmente baseado em
Bayes' Theorem (Stanford
Encyclopedia of Philosophy) plato.stanford.edu/entries/bayes-theorem
Veja também:
Howson, C.; Urach, P. Scientific reasoning: the Bayesian approach. Open
Court. 2006.
Maher,
P. Howson 2: Bayes theorem. patrick.maher1.net/471/lectures/howson2.pdf
A discussão sobre falácia da taxa de base você encontra
em:
Kahneman, D.
Thinking, fast and slow.Nova York, Farrar, Straus, Giroux, 2013.
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