Monday, June 23, 2014

Randomização blocada

Nos ensaios clínicos randomizados, os participantes são designados aos diferentes braços do ensaio de forma aleatória. Esse procedimento pode resultar em ensaios desbalanceados. Por exemplo, se duas intervenções, A e B, são designadas totalmente ao acaso para 100 participantes, pode acontecer de a intervenção A ser sorteada para, por exemplo, 68 participantes e a intervenção B para 32. O ensaio ficaria desbalanceado porque a intervenção A teria mais que o dobro de participantes. Para garantir que o número de participantes designados para cada intervenção fique próximo, usa-se randomização blocada.

Randomização blocada (blocked randomization) é o modelo de intervenção em que os participantes – no momento em que se apresentam – são organizados em blocos.  O número de participantes por bloco é igual ou múltiplo do número de braços do ensaio, mas o mesmo em todos os blocos. Os participantes são designados ao acaso aos diferentes braços do ensaio, mas dentro dos blocos.

Exemplo
Para comparar duas intervenções, A e B, os blocos podem ser formados por 2, ou 4, ou 6, ou 8 etc. participantes. Se forem organizados blocos de quatro participantes, cada bloco terá dois participantes submetidos à intervenção A e dois submetidos à intervenção B. Essas intervenções são designadas aos participantes de um mesmo bloco ao acaso. Pode ocorrer qualquer uma das sequências: AABB; ABAB, BAAB, BABA, BBAA, ABBA; na figura, um bloco com a primeira dessas sequências.
Se forem 100 os participantes, o ensaio terá 25 blocos de quatro participantes cada um. Serão designados ao acaso dois participantes para a intervenção A e dois para a intervenção B, em cada bloco, como mostra a figura dada em seguida.


A grande vantagem da randomização blocada é garantir número balanceado de participantes nos diferentes braços do ensaio. Mas tem outras vantagens: 1. os participantes podem ser diferentes se o tempo de recrutamento for longo, se eles vierem de lugares diferentes ou se os mais doentes forem primeiro atendidos; nesses casos, a randomização blocada produz braços mais comparáveis. 2. a randomização blocada garante número equilibrado de participantes por intervenção se o ensaio for suspenso.

A desvantagem do uso de randomização blocada é o procedimento para randomização, mais complicado e a análise estatística, mais difícil. Alguns pesquisadores procedem à randomização blocada e depois a ignoram na análise, o que está errado. É preciso que a análise estatística seja coerente com o delineamento.
Exemplo da literatura
 Para comparar a velocidade de ação de duas drogas (ticagrelor e clopidogrel) indicadas para prevenir a formação de coágulos de sangue que possam causar infarto agudo do miocárdio ou acidente vascular cerebral (AVC), foi conduzido um ensaio clínico1. Foram recrutados 154 pacientes, após triagem. Todos eles fizeram washout, mas 31 foram dispensados logo em seguida, devido a falhas de avaliação na triagem.

Os 123 pacientes restantes entraram no ensaio sequencialmente. A proposta era ter 12 pacientes submetidos a placebo. Organizou-se, então, uma randomização blocada até se conseguir 12 participantes no braço placebo. Como havia duas drogas em comparação, ticagrelor e clopidogrel, mais o braço placebo, foram organizados seis blocos de seis pacientes.
 Quando se constituiu o primeiro bloco com seis pacientes, foi sorteado ticagrelor para dois, clopidogrel para outros dois e os dois pacientes restantes receberam placebo. O mesmo procedimento foi adotado para outros cinco blocos. Conseguidos os 12 pacientes submetidos ao placebo, passou-se a designar apenas as duas drogas, aleatoriamente, aos demais participantes do ensaio.

Referência

Paul A. Gurbel, Kevin P. Bliden, Kathleen Butler, Udaya S. Tantry, Tania Gesheff, Cheryl Wei, Renli Teng, Mark J. Antonino, Shankar B. Patil, Arun Karunakaran, Dean J. Kereiakes, Cordel, Parris. The ONSET/OFFSET Study:Effects of Ticagrelor Versus Clopidogrel in Patients With Stable Coronary Artery Disease Assessment of the ONSET and OFFSET of the Antiplatelet. Circulation. 2009; 120:2577-2585.

Wednesday, June 11, 2014

Delineamentos de ensaios clínicos

Pertencem à História da Medicina os casos de novas intervenções cuja superioridade foi detectada sem qualquer ensaio clínico. É sempre citada a penicilina, que foi introduzida na prática médica sem muita pesquisa. No entanto, histórias de intervenções com efeitos benéficos tão dramáticos são raras. Hoje são continuamente propostas novas intervenções, mas que trazem contribuição apenas moderada e só podem ser percebidas mediante muitos e grandes ensaios clínicos. E isso é importante.

Por exemplo, Collins et al. 1 argumentam que reduzir a mortalidade por infarto do miocárdio de 14,9% para 11,4% representa um volume imenso de mortes evitadas, dada a elevada incidência do problema. Mais exatamente, são evitadas 35 mortes de cada 1000 infartados. Essa redução, mediante terapia anticoagulante na ausência de aspirina, só foi percebida por meio de uma meta análise com 26 artigos que relatavam ensaios randomizados envolvendo 5020 pacientes, tendo sido designados 2484 para a terapia anticoagulante e 2536 para o grupo controle.

  Por outro lado, não conduzir ensaios clínicos adequados no devido tempo pode ter conseqüências sérias. Um argumento a favor dos ensaios clínicos é o fato de algumas intervenções terem sido abandonadas logo depois de serem acolhidas com entusiasmo, por absoluta falta de evidência de superioridade ou, até mesmo, pelo fato de terem se mostrado prejudiciais. Exemplos clássicos de intervenções introduzidas na prática médica sem experimentação e que posteriormente se revelaram prejudiciais são a técnica de resfriamento no caso de úlcera gástrica e o uso de talidomida como antiemético para gestantes. Os ensaios clínicos são, portanto, essenciais.

Ensaio clínico é uma pesquisa na qual um ou mais seres humanos são prospectivamente designados a uma ou mais intervenções (que podem incluir placebo ou outro controle) para avaliar os efeitos dessas intervenções sobre resultados biomédicos ou comportamentais relacionados com a saúde 2.


Delineamento do ensaio (trial design) ou modelo de intervenção (intervention model) é a descrição do procedimento adotado para designar as intervenções em estudo aos diversos participantes de um mesmo ensaio clínico. Existem vários modelos de intervenção: ensaio clínico randomizado, randomização blocada, randomização estratificada, delineamento cruzado, ensaios clínicos “antes e depois”, delineamentos fatoriais. Estes são os delineamentos mais utilizados. Há que estudá-los, antes de planejar um ensaio clínico.


Referências
(1) Collins, R; MacMahon, S; Flather, M; Baigent, C; Remvig, L;Mortensen,S; Appleby,P;  Godwin, J;  Yusuf, S; Peto,R Clinical effects of anticoagulant therapy in suspected acute myocardial infarction: systematic overview of randomized trials. BMJ volume 313 14 September 1996.


https: //grants.nih.gov/grants/.../NOT-OD-15-015.ht...