Saturday, April 30, 2016

Desvio padrão: medida de dispersão dos resultados das medições

    Repetir a medição é a melhor maneira de avaliar a incerteza do resultado, desde que estejamos confiantes de que os erros sistemáticos foram minimizados. Se possível, repetimos as medições no mesmo mensurando em iguais condições muitas vezes, que indicaremos por n. Aplicamos depois técnicas estatísticas para avaliar a incerteza.

    Para entender a lógica dessa avaliação, vamos usar um exemplo clássico: a medição de tempo com um cronômetro. Isto porque o tempo de reação da pessoa que liga e desliga um cronômetro é aleatório e é, de longe, o fator que mais afeta o erro da medição do tempo.

    Imagine então que você tomou nas mãos um cronômetro para medir o período de oscilação de um pêndulo1. Você fez = 5 medições. Os resultados, em segundos, foram: 

3,9; 3,5; 3,7; 3,4; 3,5.

    A melhor estimativa para o período de oscilação do pêndulo é a média aritmética dos n = 5 resultados que você obteve: 


    Como temos repetições, podemos estimar também os erros de medição, que são aleatórios, uma vez que os erros sistemáticos foram minimizados. Observe os desvios de cada medida em relação à média, apresentados na tabela abaixo. São estimativas dos erros aleatórios.

Medidas do período de oscilação do pêndulo e desvios em relação à média, segundo a ordem da medição


    Os resultados das medições estão dispersos em torno da média, de maneira aleatória. Mas precisamos julgar o grau de dispersão desses valores, para avaliar a incerteza da medição. Alguém poderia sugerir usar a média dos desvios em relação à média como medida de dispersão. Mas veja:  


      A média dos desvios é igual a zero porque os desvios com sinal negativo cancelam os desvios com sinal positivo.  Como  lidar com os sinais negativos? Basta elevar os desvios ao quadrado. Todos os números se tornam positivos. Você então calcula a média desses valores e extrai a raiz quadrada do resultado. Obtém, assim, a fórmula do famoso desvio padrão:                                   
                              
    Mas essa fórmula é indicada para calcular o desvio padrão quando se considera a "população" das medições, ou seja, um conjunto infinito de medições do mesmo mensurando, feitas nas mesmas condições. No entanto, você dispõe de apenas cinco medições do período de oscilação do pêndulo, ou seja, uma pequena amostra do total de medições possíveis.
 
    Para calcular o desvio padrão de uma amostra, que é indicado por s, aplique a fórmula: 
                  
                                
    Você calcula facilmente o desvio padrão de qualquer amostra usando a função desvpad.A no Excel. Mas veja os cálculos intermediários para obter o desvio padrão na tabela dada em seguida.

Cálculos intermediários para obtenção do desvio padrão da amostra em estudo

    Sistematizando: para obter o desvio padrão de uma amostra de  n medições: 

1.  Some todos os resultados e divida por n, para obter a média aritmética.
2.  Subtraia a média de todos os resultados, para obter os n desvios em relação à média.
3.    Eleve os n desvios ao quadrado e some.
4.    Divida essa soma por - 1.
5.    Extraia a raiz quadrada

    É comum escrever a formula do desvio padrão como segue:

A fórmula (3) é aparentemente mais difícil do que a fórmula (2), mas na realidade é mais fácil de aplicar. Veja os cálculos intermediários na tabela abaixo.

Cálculos intermediários para obtenção do desvio padrão

Quando se apresenta a fórmula do desvio padrão para uma amostra, surge frequentemente a pergunta: por que dividir a soma dos quadrados dos desvios por n1 e não por n? Embora existam demonstrações teóricas que comprovem a necessidade dessa correção, há também uma explicação intuitiva.


   Considere um experimento em que só seja possível realizar uma única medição. Por exemplo, imagine que você utiliza um cronômetro para medir o tempo de queima de uma vela. Nesse caso, o valor obtido será a melhor estimativa para o tempo de queima, sendo, portanto, a média. No entanto, não há como estimar a dispersão dos desvios em relação à média.


   A fórmula para o cálculo do desvio padrão deixa isso claro: se n=1, então n1=0. Dividir por zero torna impossível calcular a dispersão dos desvios. É aqui que entra o ajuste 

n−1, os chamados "graus de liberdade".

    O desvio padrão é uma medida da dispersão dos resultados das medições. Para visualizar que o desvio padrão mede a dispersão, é melhor ver um exemplo. Imagine então que dois amigos seus resolveram medir, também, o tempo de oscilação do mesmo pêndulo. O Amigo Nº 1 obteve 

3,7; 3,6; 3,9; 3,5; 3,3
    O Amigo Nº 2 obteve 
4,0; 3,5; 3,7; 3,2; 3,6

   As médias e os desvios padrões, para os três, você e seus amigos 1 e 2, estão na tabela dada em seguida. Os resultados das medições estão apresentados em gráfico, logo abaixo e permitem melhor visualização da dispersão. Note que quanto maior é a dispersão, maior é o desvio padrão. 

Médias e desvios padrões para as três séries de medições

             Distribuição das três séries de medições

A avaliação tipo A da incerteza da medição, que usa o desvio padrão em seu cálculo, será tratada em outra postagem.

NOTA
          1. O exemplo do cronômetro é de Physics Laboratory Tutorial :
EXERCÍCIOS

1.    Calcule a média e o desvio padrão do resultado de cinco medições de uma peça, que forneceu os seguintes valores, em milímetros:

200,1; 200,5; 200,3; 200,2; 200,4.

 2.     Foram enviadas oito amostras de um mesmo produto que continha 10,5% de K2O para oito laboratórios diferentes. Cada laboratório fez uma determinação da porcentagem de K2O no produto. Calcule a média e a desvio padrão. As determinações são dadas em seguida.

                  10,8; 11,2; 10,5; 11,0; 10,9; 11,1; 10,8; 10,7.

 3.  Para estabelecer a capacidade de perfuração de uma perfuradora hidráulica em estruturas rochosas, foi feito um experimento. Tomaram-se medidas da profundidade (em polegadas) da perfuração feita em 10 locais. Os dados estão na tabela dada abaixo.  Calcule a média e a desvio padrão.

      Resultados do experimento para medir a capacidade de perfuração de uma perfuradora hidráulica


RESPOSTAS


Sunday, April 24, 2016

Propagação de erros: somas e diferenças

Vamos supor que você mora a uma distância confortável da escola: 825 metros ± 5 metros, em linha reta. No caminho para a escola, você faz uma parada na casa de um colega para chamá-lo e seguirem juntos. Essa parada está a 260 metros ± 10 metros da sua casa. A questão é: quantos metros você ainda deve caminhar para chegar à escola após encontrar o colega?

                                     Cálculo do valor central

É fácil calcular o valor central. Depois da casa do colega, você caminha:


                                      Cálculo da incerteza

O erro absoluto do resultado de uma soma ou de uma diferença é dado pela soma dos erros absolutos das quantidades originais.


Quando subtraímos valores com incertezas, somamos os erros absolutos:

± 5metros ± 10metros = ± 15metros

Portanto, a distância que você ainda deve caminhar após encontrar o colega é:

                                           565±15metros.

             VEJA: Error Propagation  https://phys.columbia.edu/~tutorial/propagation/

                   


Thursday, April 21, 2016

Erros sistemáticos e aleatórios nas medições

Antes de tratar erros em medições, vamos deixar claro que não estamos falando do resultado incorreto por desleixo, incompetência ou fraude. Resultados de medições de variáveis contínuas (como comprimento, peso, velocidade, pressão) estão associados a erro. Mas antes de discutir erro, convém ver algumas definições.

  1.Grandeza é o atributo de um fenômeno, corpo ou substância que pode ser distinguido qualitativamente e determinado quantitativamente.

                                         Exemplos

       ·   grandeza em sentido geral: pressão, altura, vazão, volume;

       · grandeza específica: altura da cerca, volume do reservatório.

 2. Valor de uma grandeza é a expressão quantitativa de uma grandeza específica, geralmente na forma de um número seguido da unidade de medida. 

                                      Exemplo

  •  a água está à temperatura de 28 º C.

 3. Valor verdadeiro (de uma quantidade) é o valor que seria obtido por uma medição perfeita2. Como isso é impossível, o valor verdadeiro é, em geral, desconhecido

4. Valor verdadeiro convencional ou valor convencional é valor atribuído a uma grandeza específica para uma dada finalidade e aceito pela comunidade científica em lugar do verdadeiro, dado ser impossível descobrir o valor verdadeiro dessa grandeza.

 5. Medir é determinar o valor de uma grandeza em termos do valor de uma unidade tomada como padrão.

 6. Mensurando é a grandeza que queremos medir. 

                                 Exemplo

          ·    O volume de uma caixa d’água.

 7. Resultado de uma medição é o valor atribuído a uma grandeza por medição1

                               Exemplo 

·    A altura do armário é 1,20 m. 

 

8. Erro de medição é a diferença entre o resultado da medição e o valor verdadeiro do mensurando1

 

ERRO DE MEDIÇÃO

O valor verdadeiro de um mensurando é, em geral, desconhecido porque o resultado de uma medição depende de diversos fatores, tais como o sistema de medição, o operador, o procedimento utilizado, o ambiente. Vamos definir aqui dois tipos de erro de medição: o erro sistemático e o erro aleatório.

   1. Erro sistemático é a diferença entre o resultado de um número infinito de medições do mensurando, feitas nas mesmas condições e seu valor verdadeiro 1.  

      O erro sistemático aparece devido às limitações humanas, físicas ou dos instrumentos. É difícil, ou mesmo impossível,  detectar erros sistemáticos que apareçam devido ao equipamento defeituoso, à falta de calibração, ao procedimento incorreto. De nada adianta repetir as medições nas mesmas condições, pois erros sistemáticos ocorrem sempre no mesmo sentido.

                                          Exemplos

 ·        Se a balança não estiver calibrada, não há como você saber, olhando apenas os resultados das medições, que eles estão errados. 

·        Imagine que você vai medir o período de oscilação de um pêndulo com um cronômetro. Se o ritmo do cronômetro estiver lento, sucessivas repetições das medidas produzirão sempre medidas abaixo do valor real. 

Embora o erro sistemático não possa ser eliminado, pode ser reduzido pela calibração cuidadosa dos instrumentos ou pela mudança de procedimento, por exemplo. Por essa razão, os instrumentos e sistemas de medição devem ser calibrados ou ajustados por meio de materiais de referência e de padronizações. No entanto, as incertezas associadas a esses padrões e materiais precisam ser sempre levadas em conta.

                                              Exemplo

 Para medir a cor de diversas substâncias em pó, pode ser usado um colorímetro2. Uma amostra de cor branca, que tem valor 100, pode ser usada como material de referência.

Como o valor verdadeiro é, no mais das vezes, desconhecido, trabalhamos com estimativas de erro sistemático. Denominamos tendência ou viés (em inglês, bias) à diferença entre a média dos resultados da medição e o valor convencional.

                                              Exemplo

 Um colorímetro será usado para medir a cor de diversas substâncias em pó. Uma amostra de cor branca, que tem valor 100 foi usada como valor de referência (VR). Um técnico de laboratório mediu 10 vezes a cor da amostra branca e obteve os resultados apresentados na tabela abaixo. 

               Leituras da cor de uma amostra branca


      A média é 
                                      
    A tendência ou “bias”, dada pela diferença entre a média e o valor de referência é:


    De qualquer modo, o erro sistemático é uma indicação de que o resultado da medição de uma grandeza está associado a um desvio. Se esse desvio se originar de um fator conhecido, que sabidamente afeta o resultado da medição, isto é, que tem efeito sistemático quantificável sobre o resultado da medição, deve ser proposto um fator de correção. Supõe-se que, após a correção, o valor esperado do erro provocado por esse efeito sistemático seja zero.

 2. Erro aleatório é a diferença entre o resultado da medição e a média que resultaria de um número infinito de medições do mesmo mensurando, repetidas em iguais condições 2.

  Evidentemente, é impossível fazer um número infinito de medições. Então trabalhamos com estimativas de erros aleatórios. Tomamos amostras, isto é, um número n de medições e obtemos os desvios da média da amostra.

   Dizemos que os erros são aleatórios porque, numa série de medições repetidas nas mesmas condições, não é possível prever o resultado de uma nova medição com base nos valores obtidos anteriormente.

                                               Exemplo

     Com um cronômetro na mão para medir o período de oscilação de um pêndulo, você fez n=5 medições. Os resultados, em segundos, foram:

                       3,9; 3,5; 3,7; 3,4; 3,5. 

    A média das n=5 medidas é 

Resultados das medições do período de oscilação de um pêndulo 

   Veja a tabela acima: há valores acima e abaixo da média, mas a variabilidade ocorre ao acaso. Se você estiver fazendo muitas medições, não há como saber se o próximo resultado que irá obter estará abaixo ou acima da média que ainda vai calcular. Isto acontece porque os erros aleatórios são causados por flutuações desconhecidas ou imprevisíveis.

  Estimativas de erros aleatórios são obtidas da distribuição aleatória dos resultados das medições em torno da sua média.  

   Ainda como exemplo, a tensão em uma rede de energia elétrica é função da variação do consumo durante o dia. Há horários conhecidos de picos de consumo, mas também ocorrem, aleatoriamente, momentos de alta e baixa tensão. 

 Finalmente, não se pode deixar de falar aqui nos chamados erros grosseiros (é a tradução possível para mistake ou blunder, palavras da língua inglesa). Esses são erros ilegítimos e precisam ser corrigidos, repetindo as operações.  

 VEJA:

    1.     International Vocabulary of Basic and General Terms in                                    Metrology (VIM)

2.     International Organization for Standardization (ISO)

3.     http://climatica.org.uk/climate-science-information/uncertainty

4.     Automotive Industry Action Group. http://www.aiag.org/scriptcontent/index.cfm

5.     http://www.spcforexcel.com/variable-measurement-systems-part-2-bias

6.     https://phys.columbia.edu/~tutorial/rand_v_sys/

7.     Mello, G. Erro de medição. http://www.exactusmetrologia.com.br/content/erro-de-medicao

8.     Avaliação de dados de medição — Guia para a expressão de incerteza de medição. http://www.inmetro.gov.br/noticias/conteudo/iso_gum_versao_site.pdf

9.     http://user.physics.unc.edu/~deardorf/uncertainty/definitions.html

10.  Definitions of Measurement Uncertainty Terms.http://www.spcforexcel.com/variable-measurement-systems-part-2-bias

11.  http://www.inmetro.gov.br/inovacao/publicacoes/INTROGUM_2009.pdf

12.  Avaliação de dados de medição — Uma introdução ao “Guia para a expressão de incerteza em medição” e a documentos correlatos - INTROGUM - 2009 -