Wednesday, March 23, 2016

Tamanho da amostra para comparar duas proporções

Uma mestranda de odontologia que não conheço pediu por e-mail que eu lhe desse uma “pequena ajuda” em seu trabalho: responder à famosa questão “qual deve ser o tamanho da amostra?” Lembrei a ela de que não seria difícil calcular esse tamanho, se me fossem dadas algumas informações que começariam, evidentemente, com o propósito do trabalho. Depois de algumas idas e vindas, chegamos ao texto abaixo, editado por mim, que sou professora de estatística (e desconheço o jargão da área de odontologia).

Para comparar a efetividade de dois métodos indicados para clareamento dental, será feito um ensaio clínico usando dois grupos de pacientes: um grupo será submetido a um método convencional, que chamaremos de A. O outro grupo será submetido a um método alternativo já testado, que chamaremos de B. Supõe-se que esses métodos possam ter efetividade diferente. O desfecho será uma variável dicotômica, isto é, sim ou não para cada participante da pesquisa, indicando se houve ou não clareamento nos dentes. A avaliação será feita por profissional, fazendo uma leitura inicial e outra após o clareamento. Serão submetidos a essa avaliação n pacientes que passarem pelos critérios de elegibilidade e que serão designados para o método A ou para o método B por processo aleatório.

Informei à mestranda que há uma fórmula para calcular o tamanho dessa amostra, para comparar o método alternativo com o método convencional.
                        











A resposta chegou em tom irritado: “eu não quero fórmulas de livros, quero a resposta para o meu problema”. Então perguntei: “qual seria a porcentagem de pessoas em que você espera “ver” clareamento quando usar o método A? E o método B?” E a resposta foi aquela que já ouvi muitas vezes, em se tratando de calcular tamanho de amostras: “se eu soubesse, não faria a pesquisa”. Pois é, e a literatura da área?

Mas nessa situação, ou se improvisa ou não se responde. Então, improvisei: considerei o nível de confiança mais comum nos trabalhos publicados: 95%. Para poder de teste, é usual recomendar 80% (não é comum ver poder de teste citado em teses no Brasil). E os valores de p? Busquei na internet.

Achei, em um site americano1, a seguinte frase: “Generally, tooth whitening is successful in at least 90 percent of patients.” Então considerei, só para ser prudente, p=0,88 e p=o,65.Para testar a hipótese de que a diferença entre as verdadeiras proporções é zero, isto é, H0: D = 0, contra a hipótese de que é diferente de zero, isto é, H1: D 0, temos:






A amostra deverá ter 100 pacientes, igualmente divididos em dois grupos, para detectar uma diferença de 23%.  

Você obtém este resultado se fizer os cálculos em:
https://select-statistics.co.uk/calculators/sample-size-calculator-two

É importante assinalar que alguns autores calculam o tamanho de n por outra fórmula, ou seja:
Nessa fórmula:


Para o exemplo em discussão:
PA= 0,88
PB= 0,65
Za/2 é o valor crítico da distribuição normal. Para o nível de confiança de 95%, a =0,05; o valor crítico para um teste bilateral é 1,96.
               Zb é o valor crítico da distribuição normal. Para poder de 80%, b =0,05; o valor crítico                    é 0,84. Então:

Usando esta fórmula, você estima o valor da amostra em 106 pacientes, igualmente divididos em dois grupos, para detectar uma diferença de 23%.  

Hoje, pensado mais sobre o assunto, eu faria diferente. Primeiro, consideraria pA = 90%, seguindo a literatura que encontrei. Estimaria pB =70%. Estimaria pB =70%. Isto significa que uma diferença estimada de 20% ou mais em favor do método convencional seria significante. A melhor indicação é um teste unilateral. Nesse caso:


São necessárias 46 ou, melhor 47 participantes em cada grupo.

Alguns autores calculam o tamanho da amostra usando a média das estimativas preliminares das proporções. Então:


Faça o cálculo em:

                 https://www.stat.ubc.ca/~rollin/stats/ssize/b2.html

E valem aqui algumas observações:
  •        Amostras grandes mostram significância, mesmo que a associação entre as variáveis seja pequena. De posse dos dados, convém calcular um coeficiente de associação entre clareamento dental e método. Mas do ponto de vista do estatístico, quanto maior for a amostra, melhor. Amostras grandes são, porém, trabalhosas e demoradas. Por conta disso, o profissional se cansa e pode, eventualmente, mudar os critérios de avaliação ao longo do processo.
  •      Se a verdadeira diferença entre duas proporções for muito pequena, não será detectada por estatística (só como exemplo, como detectar a diferença de 1% nas intenções de votos para dois candidatos numa eleição no Brasil?). Dadas às flutuações das estimativas das amostras, diferenças pequenas cairão dentro das margens de erro.

Finalmente, a mestranda me informou que sua orientadora não aprovou o parecer, ou melhor, dispensou minhas considerações. Como o desperdício sempre me aborrece, não vou jogar no lixo o que fiz. Talvez alguém aproveite – mas se achar erro, por favor, me corrija. 


Referência

           1.     The risks of teeth whitening - Delta Dental

Veja algumas calculadoras para tamanho de amostras:

https://select-statistics.co.uk/.../sample-size-calculator-two-proport.
https://www.stat.ubc.ca/~rollin/stats/ssize/b2.html

epitools.ausvet.com.au/content.php?page=2Proportions
https://www2.ccrb.cuhk.edu.hk/stat/proportion/Casagrande.htm


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