A informação numérica
não atinge todas as pessoas, porque interpretar números exige treino e certo
gosto pela Matemática. E a maior parte das pessoas não se acostumou a gostar de
Matemática... No entanto, para entender um assunto, é preciso captar não apenas
as ideias, mas também adquirir noção dos valores numéricos envolvidos. Um homem
é importante, mas um homem carregando uma mala com 500 mil dólares está
clamando por atenção...
Na nossa sociedade,
boa parte da informação é apresentada na forma de números. As prévias
eleitorais, as pesquisas de mercado, as pesquisas de opinião pública são
apresentadas na forma de números e de porcentagens. As cotações na bolsa de
valores, a rentabilidade de uma empresa, a eficiência de um serviço são dados
na forma numérica. Então, no mundo de hoje, é preciso saber interpretar
"números".
Mas para tirar a
verdade dos números, é preciso conversar longamente com eles. De nada adianta torturá-los.
Há quem diga que a taxa de desemprego não pode ser tão alta porque vê seus
amigos e familiares bem empregados. Diante de um comentário como esse (uma
mutilação da população em estudo) cabe apenas o grito do estrategista de Bill Clinton 1:
"It’s
the economy, stupid."
De qualquer forma, as
informações numéricas são mais facilmente assimiladas quando apresentadas na
forma de gráficos. Mas pense bem: se já não entendemos taxas e índices que têm
definição explícita, será que entenderemos os gráficos, um passo a mais? A
apresentação gráfica é, porém, muito clara, embora não seja precisa. Os gráficos de setores, por exemplo, são
muito usados para mostrar as diversas partes em que se divide o todo. Então, para
comparar a força eleitoral de três candidatos, A, B e C, um instituto de
pesquisa pode tomar uma amostra de eleitores, perguntar a cada um deles em quem
irá votar e depois calcular a porcentagem de eleitores de cada candidato. Imagine,
então, que foram entrevistados 2.500 eleitores e se obteve os dados
apresentados na Tabela 1.
Tabela 1
Distribuição
de eleitores segundo a intenção de voto
Distribuição de
eleitores segundo a intenção de voto
Figura 2
A fatia de cada
candidato
Também podem ser feitos gráficos de rosca que,
praticamente, são o mesmo gráfico de pizza, mas sem a parte central. Veja a
Figura 3.
Figura 3
Distribuição dos
eleitores segundo a intenção de voto
Os dados da Tabela 1 também poderiam ser
apresentados em gráficos de barras. Mas vamos colocar outros dados, para você
praticar o desenho de gráficos com outros números. Imagine que uma empresa
realizou uma pesquisa de opinião pública relativa à eleição para prefeito municipal em determinada cidade.
Havia quatro candidatos, que chamaremos de A, B, C e D. Foram entrevistados
3.000 eleitores e obtidos os seguintes resultados: 1.080 dos votos seriam para
o candidato A, 810 dos votos seriam para o candidato B, 330 dos votos seriam
para o candidato C e 240 dos votos seriam para o candidato D. Havia 18% de
indecisos. Veja a Tabela 2.
Tabela 2
Distribuição
percentual da intenção de votos para prefeito municipal
Para bem apresentar a
grandeza relativa das porcentagens, pode ser feito um gráfico de barras. Trace o sistema de eixos cartesianos e desenhe
barras da mesma largura, com base no eixo das abscissas e altura dada pelos
percentuais de intenção de voto. Esse gráfico, que hoje é feito em computador, permite
visualizar a situação. Veja a Figura 4: o gráfico foi feito com os dados da
Tabela 2.
Figura 4
Distribuição
percentual da intenção de votos para prefeito municipal
Na Figura 4 tudo está
suficientemente claro, mas você pode querer melhorar o aspecto visual. Dê uma
terceira dimensão à figura – é o chamado gráfico em 3D. Com os dados da Tabela
2, foi feito a Figura 5. É muito importante manter todas as barras com a mesma
largura.
Figura 5
Distribuição
percentual de votos para prefeito municipal
Cuidado, porém, com
os gráficos de barras. Quem desenha um gráfico de barras precisa saber que a
altura da barra – e somente a altura – deve ser proporcional ao valor da
variável quantitativa. A largura das barras é, obrigatoriamente, a mesma.
Por exemplo, dados
apresentados pela Organização
das Nações Unidas (ONU) para a Alimentação e a Agricultura (FAO)8
mostraram que em 2015 o Brasil detinha 59% do seu território coberto com 493,5
milhões de hectares de florestas (naturais e plantadas). Mas o mesmo estudo da
FAO indica que o Brasil reduziu em 984 mil hectares suas florestas naturais entre
2010 e 2015. Veja a Figura 6, que está correta.
Figura 6
Extensão do território
brasileiro coberto por florestas
Imagine
agora que você quisesse mostrar muito mais desmatamento do que o ocorrido. Você
não faria barras honestas, mas um desenho “artístico”, como exibido na Figura 7:
as larguras diferentes dos desenhos dariam ao incauto leitor a visão de diferença
muito maior entre o desmatamento de 2010 e 2015 do que de fato ocorreu! Mas
esse gráfico estaria errado – ótimo para fake
news.
Figura 7
Extensão do território brasileiro
coberto por florestas
Figura 8
Lucros em milhares
de reais, mês a mês
A Figura 8 tem a
clareza necessária. No entanto, alguns gráficos não mostram coisa alguma. Por
exemplo, cuidado com os gráficos que não apresentam nem escalas, nem unidades
de medida. Sem escalas e sem saber como os dados foram medidos, aumentos
irrisórios podem parecer "aumentos evidentes", pelo menos visualmente.
Observe a Figura 9: sem escalas nos eixos, não há como dizer o tamanho dos lucros.
E a prestação de contas? Mera fake news.
Figura 9
Aumentos nos lucros
A impressão visual
muda se você alterar o ponto de mínimo no eixo vertical. Se o mínimo ficar
acima de zero, a variação fica muito mais impressionante. Observe a Figura 10: o
segundo gráfico parece mostrar nítida tendência de alta enquanto o primeiro é bem
mais comedido.
Figura 10
Cotação das ações
da empresa: dois pontos de vista
Esses truques são bons, mas existe outro truque
para maquiar os gráficos. Você já viu espelhos curvos, que modificam a imagem?
Conforme o grau de curvatura do espelho, você fica "gordo" ou
"magro"? Pois use essa ideia, se quiser mudar a aparência de seu
gráfico.
Se você for um
vendedor de carros, por exemplo, e quiser mostrar como o volume de vendas na
concessionária tem aumentado desde que você chegou, não é preciso pensar duas
vezes! "Puxe" o gráfico no sentido vertical, como foi feito no segundo
gráfico da Figura 11.
Figura 11
Nº de carros
vendidos: dois pontos de vista
Você pode usar esses
truques para explicar como anda a economia de uma nação. Só para treinar, faça
gráficos da inflação, do crescimento do PIB, do aumento do salário mínimo. Mas
desenhe sempre dois gráficos: um segundo o governo e o outro, segundo a
oposição, só mexendo nas escalas...
Referência
1. It's the economy, stupid (É a economia, estúpido!).
Frase cunhada por James Carville, estrategista da campanha vitoriosa de Bill
Clinton em 1992. Disponível em: https://en.wikipedia.org/wiki/It%27s_the_economy,stupid.
Acesso em 29 de setembro de 2021.
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