Wednesday, March 25, 2020

Medidas repetidas: teste de esfericidade


    “Medidas repetidas” é o termo usado para indicar que as mesmas unidades são submetidas a todas as intervenções que estão em teste no ensaio. Em outras palavras, um ensaio com medidas repetidas é aquele em que a mesma unidade é medida tantas vezes quantas sejam as intervenções em teste. Seria o caso, por exemplo, de um estudo para saber o efeito de uma droga como analgésico em quatro participantes. Podem ser feitas três medidas de alívio de dor, uma no início do ensaio (linha de base, às 15 horas) e as outras duas horas depois, isto às 17 e às 20 horas. Veja a figura abaixo.                                      

    Tais intervenções também podem ser tratamentos como, por exemplo, colocar 5 degustadores (1, 2, 3, 4, 5) para testar, cada um, 4 tipos diferentes de café (os tratamentos). Esse delineamento é de medidas repetidas porque cada degustador deu uma classificação para cada tipo de café. A variável independente é o degustador e a variável dependente é a classificação do café. Veja a figura.


  É claro que, quando dizemos unidades, não estamos nos referindo apenas a pessoas. Experimentos com medidas repetidas podem ser feitos com plantas, animais, empresas, objetos. Mas vamos nos referir aqui apenas a uma variável independente. Assim, no primeiro exemplo, a variável independente seria alívio da dor e no segundo exemplo, a classificação do café.


Pressuposições para a análise com medidas repetidas
1.   Variável independente deve ser contínua.
2.   Cada unidade foi medida repetidas vezes.
3.   Não deve haver valores discrepantes.
4.   A variável dependente deve ter distribuição aproximadamente normal.

5.   Deve haver esfericidade. O que é esfericidade?
   Sabemos que, para fazer uma análise de variância, é preciso haver homogeneidade de variâncias entre grupos. Você encontra, neste blog, explicação sobre o teste de Levene, que testa a homogeneidade de variâncias entre grupos independentes. Mas quando fazemos análise de medidas repetidas, temos a tendência de achar que o problema simplesmente “desaparece”. Mas é preciso testar a esfericidade, porque a não esfericidade faz aumentar o erro tipo I, ou seja, aumenta a probabilidade de detectar erradamente significância do resultado.


Esfericidade é a condição em que as variâncias das diferenças entre todas as combinações de grupos são iguais.
                                                    Exemplo
  Para ilustrar o que significa esfericidade, vamos utilizar os dados fictícios apresentados na tabela dada em seguida. São seis sujeitos medidos em três tempos. Também são dados, na tabela, as diferenças entre cada combinação de grupos (os tempos)nas três últimas colunas da tabela. No rodapé da tabela estão as variâncias das diferenças entre combinações de grupos.
                                     Tabela com medidas repetidas 



   Calculamos as diferenças entre cada combinação de grupo (ponto do tempo) (as últimas três colunas na tabela acima). Como são três pontos no tempo, temos três combinações diferentes. É claro que o número de combinações possíveis será tanto maior quanto mais pontos (ou condições, ou grupos, ou tratamentos) tivermos.
  Calculamos as variâncias para as diferenças apresentadas na tabela acima. Olhando os resultados, temos a sensação de as variâncias das diferenças não são iguais (13,9 vs. 17,4 vs. 3,1). Parece que nossos dados violam a suposição de esfericidade. Vamos então proceder ao teste de esfericidade de Mauchly.

                              Teste de esfericidade de Mauchly.

   O teste de esfericidade de Mauchly é uma maneira formal de testar a hipótese de esfericidade. Mas esse teste nem sempre detecta desvios da esfericidade em amostras muito pequenas, nem em grandes amostras. Mesmo assim, é o teste mais comumente usado. Vamos então ver como utilizá-lo, usando o programa SPSS.


  Se o teste for estatisticamente significante, devemos rejeitar a hipótese de esfericidade, ou seja, rejeitamos a hipótese de que as variâncias das diferenças entre grupos são iguais. Para o exemplo, os resultados do teste de esfericidade de Mauchly são dados abaixo.
             
   Os resultados do teste mostram que a esfericidade não foi violada (p = 0,188) Podemos, portanto, escrever:

O Teste de Esfericidade de Mauchly indicou que a hipótese de esfericidade não foi violada, c2(2) = 3,343, p = 0,188.


   Você deve ter notado a discrepância entre o resultado do teste de esfericidade de Mauchly, que indica que a esfericidade não foi violada e as grandes diferenças nas variâncias apresentadas na tabela acima (13,9 vs. 17,4 versus 3,1), sugerindo que a hipótese de nulidade deveria ser rejeitada. Mas este é um dos problemas do teste de Mauchly que tende a não rejeitar a hipótese da nulidade quando a amostra é pequena, como mencionado anteriormente.

  Se seus dados não violam a hipótese de esfericidade, que é uma pressuposição para proceder à ANOVA, a estatística F calculada será válida. (Se você estiver usando o programa SPSS, procure os resultados na(s) linha(s) de "esfericidade assumida").

  Quando a hipótese de esfericidade for violada, o que não é incomum, a estatística F tem viés e aumenta a probabilidade de erro tipo I. Para superar esse problema, foram propostas algumas correções.

Veja:
Field, A. Descobrindo a Estatística usando o SPSS.2 ed.Porto Alegre: Artmed,2009.
Sphericity. Disponível em: https://statistics.laerd.com/statistical-guides/sphericity-statistical-guide.php.Acesso em 24 de março de 2020.
Frost, J. Repeated measures designs: benefits and an ANOVA Example. Disponível em: https://statisticsbyjim.com/anova/repeated-measures-designs-benefits-anova-example/ Acesso em 23 de março de 2020.