Sunday, February 23, 2014

MAIS SOBRE ANÁLISE DE CONTEÚDO

Reveja o blog anterior, sobre análise de conteúdo. É possível estabelecer outras categorias em lugar das que foram consideradas?  Sem dúvida, a definição das categorias é opção do analista. Apenas para exemplificar, vamos construir outras categorias ou “caixas” para locar os resultados da avaliação dos alunos do Curso de Mestrado em Bioética do Centro Universitário São Camilo sobre a disciplina de Metodologia Científica ministrada em 2011, ou seja, vamos fazer uma categorização diferente da apresentada no blog anterior com os mesmos dados. Vamos construir quatro categorias ou “caixas”, quais sejam:


1. Muito satisfatória, com as palavras: “ótima”, “muito satisfatória” 

2. Satisfatória com as palavras: “satisfatório” e “bom” (se o adjetivo não estiver acrescido de comentário desabonador);

3. Pouco satisfatória com as palavras: “adequada” e “regular”

4.  Nada satisfatória com a palavra: “ruim”.


Esta categorização pode ser apresentada em um gráfico de barras, que dá bem a sensação de colocar palavras e frases dentro de” caixas”, como expressa Bardin (1). Veja a figura dada em seguida.


Para fazer uma análise de categorias, você primeiro lê o texto e categoriza palavras e frases. É o que se chama identificar as unidades de registro (palavras, recortes de falas, temas).

  Por exemplo, você faz, com outros colegas da empresa, uma entrevista para selecionar estagiários. Todos os seus colegas apresentam por escrito suas apreciações dos candidatos nos quesitos apresentação, conhecimento, grau de escolaridade etc.. As palavras serão variadas. Você pode optar por colocar numa só categoria – digamos aprovado – palavras como ótimo, bom, excelente, aceitável – e em outra categoria – reprovado – palavras como desagradável, ruim, horrível, sofrível. A análise de categorias é, portanto, um método taxonômico: estabelecem-se as caixas ou gavetas (categorias) e se coloca cada coisa em seu lugar. Depois, é só fazer as contagens. 

 As categorias devem ser: homogêneas, exaustivas, mutuamente exclusivas, pertinentes. Para entender o significado dessas palavras, imagine que você pede para várias pessoas dizerem o que acham do tamanho de uma sala. Você já tem as categorias possíveis, ditadas pela sua experiência. São elas: tamanho grande, tamanho correto, tamanho pequeno. Para que as categorias sejam:


1.  Homogêneas, as caixas devem conter palavras com significados semelhantes ou próximos. Palavras como grande, enorme, ampla, demais são categorizadas como “tamanho grande”. Palavras como legal, tudo bem, OK são categorizadas como “tamanho correto” e palavras como pequena, acanhada, estreita, sem espaço são categorizadas como “tamanho pequeno”. Note que há homogeneidade em cada categoria. E se uma pessoa disse “agradável”? Você é o analista: então ou você entende que o tamanho está correto, ou descarta a resposta, ou volta à pessoa para entender o significado da palavra.

2.  Exaustivas, isto é, todas as palavras e frases do texto devem ser colocadas em caixas. Não podem sobrar respostas que não encontraram seu lugar em uma caixa. Claro, abra uma caixa para "outras respostas" se houver algumas respostas sem sentido.

3.  Mutuamente exclusivas, ou seja, a palavra que está em uma caixa não poderia estar em outra. Então, pessoas que disseram que a sala era grande estão numa caixa que não pode conter pessoas que acharam a sala pequena.

4.  Pertinentes, ou seja, as caixas devem ter identificação adequada ao conteúdo da pergunta. Por exemplo, não escreva  “organizada”, “desorganizada” para categorizar tamanho de uma sala.

 Mas não se preocupe. Regras existem, mas nem sempre são aplicadas. De qualquer forma, você já sabe que para fazer uma análise de categorias, é  preciso:      

       1.  Fazer uma primeira leitura do texto (é o que os especialistas chamam de leitura flutuante) buscando captar como construir a análise.

        2.  Marcar as unidades de registro.

     3. Construir “caixas” onde colocar as unidades de registro. Claro, as caixas devem contemplar o problema.

      4. Verificar se as caixas são exaustivas, isto é, podem conter todas as unidades de registro e são mutuamente exclusivas, ou seja, quem está numa caixa não se encaixaria em outra.

      5. Colocar as unidades de registro em suas devidas caixas. Cuide para que as unidades dentro da mesma caixa sejam homogêneas.

                                                Referência

     Bardin, L Análise de conteúdo. São Paulo, Edições 70, 2011.

 

 


Saturday, February 15, 2014

Análise de conteúdo: categorização


Na definição de Bernard Berelson 1, análise de conteúdo é uma técnica para a descrição objetiva, sistemática e quantitativa do conteúdo manifesto das comunicações. A análise de conteúdo 2 busca, portanto, palavras, frases, temas e conceitos dentro de um texto e os quantifica de maneira sistemática e objetiva. O resultado é usado para fazer inferência sobre as mensagens dentro do texto. Das análises de conteúdo, a mais comum é a análise de categorias 3.
Vamos fazer uma análise de categorias para um exemplo real. O Centro Universitário São Camilo adota a avaliação das atividades de docência como procedimento usual. Essa avaliação é feita por meio de um questionário elaborado por especialistas, que é entregue aos alunos no término de cada curso. Depois de respondidos anonimamente, os questionários são entregues pelos próprios alunos à administração e uma cópia das respostas é encaminhada ao professor responsável pelo curso.
Os dois grandes tópicos (dimensões) do questionário – avaliação da disciplina e avaliação do docente – são desmembrados em variáveis que são apresentadas como questões abertas. Veja em seguida:                          
            Avaliação da disciplina
1. Organização
2. Conteúdo
3. Outros Itens Pertinentes
Avaliação do docente
1. Relacionamento interpessoal
2. Habilidade de comunicação
3. Habilidades técnicas de ensino (Didática)
4. Domínio do Conteúdo
5. Outras Questões
Os dados apresentados neste exemplo referem-se à avaliação feita por 15 alunos da Disciplina de Metodologia Científica por mim ministrada no primeiro semestre de 2011 no Curso de Mestrado em Bioética. Estão aqui apresentadas apenas as respostas ao primeiro item do questionário, isto é, à organização da disciplina. Veja o que foi respondido.
1.      ÓTIMA.
2.      A seqüência das aulas seguiu uma seqüência lógica, pena que faltou algum aprofundamento.
3.      Organização boa das aulas; para abordar o assunto numa carga horária da disciplina relativamente pequena.
4.      Regular – Não tivemos Acesso a um pano (sic) de curso.
5.      Satisfatório.
6.      Ruim. – Dificuldade na utilização das ferramentas.
7.      Boa organização dos tópicos da disciplina.
8.      Apresenta boa organização quanto ao conteúdo e a Proposta.
9.      Bom.
10.   Disciplina preparada previamente, com seguimento fiel das aulas previamente preparadas.
11.   Adequada.
12.   Boa organização dos temas.
13.   Muito satisfatório.
14.   Boa organização do conteúdo com demonstrações de planejamentos e desenvolvimento dos objetivos.
15.   Boa organização.
Como as questões são abertas, as respostas são diferentes, mas expressam a opinião dos alunos sobre a organização da disciplina. É razoável categorizar e, depois, quantificar as respostas, ou seja, aplicar uma análise de categorias. Foram organizadas três categorias a priori:
·          Avaliação positiva (cor verde)
·          Situação de advertência (cor amarela)
·          Avaliação negativa (cor vermelha).
 A justificativa para o estabelecimento dessas categorias é o fato de elas bem orientarem o professor, colocando a quantidade de opiniões favoráveis, de advertência e de crítica, em cada variável de cada dimensão estudada. Neste exemplo, é dada a análise da variável “Organização da Disciplina”, dimensão Avaliação da Disciplina. Com a análise de todas as variáveis, o professor pode facilmente verificar onde estão seus “pontos fortes” e aonde deve melhorar. É claro que a atribuição verde, amarelo ou vermelho é subjetiva, mas veja o que foi feito para o exemplo:
1.    ÓTIMA.
2.    A sequência das aulas seguiu uma sequência lógica, pena que faltou algum aprofundamento.
3.    Organização boa das aulas; para abordar o assunto numa carga horária da disciplina relativamente pequena.
4.    Regular – Não tivemos Acesso a um pano (sic) de curso.
5.    Satisfatório.
6.    Ruim. – Dificuldade na utilização das ferramentas.
7.    Boa organização dos tópicos da disciplina.
8.    Apresenta boa organização quanto ao conteúdo e a Proposta.
9.    Bom.
10.  Disciplina preparada previamente, com seguimento fiel das aulas previamente preparadas.
11.  Adequada.
12.  Boa organização dos temas.
13.  Muito satisfatório.
14.  Boa organização do conteúdo com demonstrações de planejamentos e desenvolvimento dos objetivos.
15.  Boa organização.
  Foram consideradas avaliações positivas (cor verde) as respostas:
1; 3; 7; 8; 9; 10; 12; 13; 14; 15.
   Foram consideradas como situação de advertência (cor amarela) as respostas:
2; 4; 5; 11
   Foi considerada categoria negativa a resposta:
6.
Esta categorização pode ser apresentada em um gráfico de barras, que dá bem a sensação de colocar palavras e frases dentro de ”caixas”, como expressa Bardin 3.

A análise aqui apresentada provavelmente tem algum viés, porque foi feita pela autora, que também ministrou as aulas. Claro, as críticas sempre chamam mais a atenção e o professor busca o que foi negativo na organização das aulas. A frase “Ruim. – Dificuldade na utilização das ferramentas” não é, porém, explícita. Afinal, qual é a crítica do aluno: faltou o ferramental organizacional de uma exposição didática ou faltou habilidade no uso de um mouse, por exemplo?

                                            REFERÊNCIAS

1.       Berelson, B.  Content analysis in communication research. New York, Free Press, 1952. In: Palmquist, M. Content Analysis   http://www.colostate.edu/Depts/WritingCenter/references/
2.       Stemler, S. An Overview of Content Analysis http://pareonline.net/getvn.asp?v=7&n=17
3.       Bardin, L Análise de conteúdo. São Paulo, Edições 70, 2011.



Saturday, February 08, 2014

Pesquisa qualitativa? Pesquisa quantitativa?

Pesquisa é uma forma de investigação. Para haver pesquisa, é necessário haver um problema a resolver ou uma pergunta a responder. Toda pesquisa busca ampliar o conhecimento, seja qual for a área do pesquisador. No entanto, esse processo envolve riscos, incertezas e a necessidade de reunir evidências que sustentem a argumentação para chegar a uma resposta ou solução. E para isso, é preciso coletar dados.

Chamamos de método de pesquisa a estratégia usada na coleta de dados — ou seja, a técnica escolhida para reunir as informações necessárias. Mas quais são esses métodos?

De forma geral, uma pesquisa pode seguir dois caminhos principais:

         🔺 Pesquisa qualitativa
                   🔺Pesquisa quantitativa

Apesquisa qualitativa busca entender o comportamento, as opiniões, as atitudes, os medos e as crenças das pessoas. Ou seja, foca no significado que os indivíduos atribuem às suas experiências e ao mundo em que vivem. Os dados são coletados por meio de entrevistas, grupos focais, observação direta, análise de discursos e documentos — em geral, por meio de textos.

Já a pesquisa quantitativa busca contar, ordenar e medir. Seu objetivo é descrever a frequência e a distribuição dos fenômenos, identificar relações entre variáveis, testar hipóteses e calcular intervalos de confiança e margens de erro. Trata-se, portanto, da coleta e análise de dados numéricos.

Em algumas áreas do conhecimento, há disputas sobre qual método seria “melhor”. Mas o ideal é estudar as estratégias lado a lado. Elas não são opostas nem excludentes: são complementares.

Um exemplo: um pesquisador que deseje entender a experiência subjetiva de pessoas com uma doença mental deve conduzir entrevistas e analisar os relatos — trata-se de pesquisa qualitativa. Já aquele que pretende estudar a distribuição da doença na população deve recorrer à pesquisa quantitativa, aplicando questionários estruturados a um número elevado de participantes.

Geralmente, a pesquisa qualitativa precede a quantitativa. Um exemplo prático: após um grande incêndio, o pesquisador pode entrevistar um pequeno grupo de pessoas para levantar expressões frequentemente usadas para descrever sentimentos vividos na ocasião. Com base nesses dados, pode então elaborar um questionário e aplicá-lo a centenas de pessoas, a fim de comparar as reações emocionais entre diferentes grupos.

Historicamente, a pesquisa qualitativa enfrentou resistência em áreas como a saúde, por usar amostras pequenas e por não permitir generalizações. Muitas vezes, foi rotulada como “ciência branda” (soft science). No entanto, como argumentam seus defensores, nenhum método garante a verdade absoluta. O que importa é a competência do pesquisador, a qualidade dos dados, a análise criteriosa e as conclusões bem fundamentadas.

A resposta é simples: depende da pergunta que se quer responder. Pesquisas quantitativas podem revelar padrões que demandem uma abordagem qualitativa posterior. E o oposto também pode ocorrer. Veja alguns exemplos:

🔺 Pesquisa de intenção de voto: o pesquisador pergunta a milhares de pessoas “Se a eleição fosse hoje, em quem o(a) senhor(a) votaria?”. Depois calcula percentuais, margens de erro e intervalos de confiança. Isso é pesquisa quantitativa.

🔺 Prévias eleitorais: o entrevistador pergunta “Quais qualidades um presidente deve ter?” ou “Quais são os principais problemas do país?”, buscando compreender percepções e valores. Isso é pesquisa qualitativa.

🔺A pergunta “Que proporção de fumantes já tentou parar de fumar, considerando sexo e faixa etária?” exige uma abordagem quantitativa, com questionários estruturados e análises estatísticas.

🔺Para entender os motivos que impedem alguém de parar de fumar, a pesquisa deve ser qualitativa, com entrevistas individuais e análise de conteúdo.

🔺 Para saber o que as pessoas entendem por descriminalização das drogas, entrevistas em profundidade com um grupo pequeno de participantes são o melhor caminho (qualitativo). Já para estimar o percentual da população a favor ou contra, e como essa opinião se distribui por sexo, idade, escolaridade, região, é necessário um estudo quantitativo com amostra ampla.