1.
Definições
Biodisponibilidade (bioavailability)
é um termo usado em farmacocinética para descrever a quantidade e a velocidade
com que uma droga, ou outra substância, fica disponível em seu lugar de ação
depois de ter sido administrada em dose única.
Como nem sempre é possível medir a concentração da droga em seu
lugar de ação, monitora-se a concentração da droga no sangue ou na urina. O
pressuposto é o de que a concentração da droga em seu lugar de ação fica em
equilíbrio com a concentração da droga no sangue ou na urina.
Para entender todo esse processo, são
conduzidos ensaios nos quais se estabelecem a dosagem, a via de administração e
a forma farmacêutica (comprimido, cápsula, pó, solução ou suspensão) da droga,
além dos intervalos de tempo em que serão feitas as medições. Se o ensaio for
feito com seres humanos, é preciso recrutar voluntários seguindo as normas da
CONEP-CNS-MS e os critérios de elegibilidade, dados pela ANVISA.
2.
Análise estatística dos dados
Determinar a biodisponibilidade de uma droga, na prática, significa
calcular em que quantidade e quão depressa essa droga aparece no sangue (ou na
urina) do participante de pesquisa, depois de administrada em dose única.
Para isso, são tomadas diversas amostras de
sangue (ou na urina) do mesmo voluntário – uma imediatamente antes da
administração da droga e as demais em intervalos de
tempo pré-estabelecidos – para nelas medir a concentração da droga
É usual indicar a dose administrada da droga (loading dose) por D.
As concentrações da droga no sangue ou na urina são medidas em microgramas por
mililitro. O intervalo de tempo em que são feitas as medições (dosing
interval) é indicado pela letra grega t (lê-se tau) e a unidade de medida
é, usualmente, hora.
Exemplo
Veja
os dados (fictícios) apresentados abaixo, que serão utilizados para ilustrar o
procedimento da análise estatística em estudos de biodisponibilidade.
Tabela 1
Tempo
após a administração da droga (em horas) e concentração da droga no sangue (em
microgramas por mililitro)
Com os pares de dados obtidos – tempo em
que foi tomada cada amostra de sangue e concentração da droga na amostra de
sangue – desenha-se a curva da concentração da droga em função do tempo. Veja a
figura abaixo.
Figura 1
2.1.
Parâmetros farmacocinéticos
Três importantes parâmetros farmacocinéticos são obtidos
diretamente da curva de concentração da droga no sangue (ou na urina).
·
Concentração
máxima (Cmáx)
·
Tempo
para atingir a concentração máxima (Tmáx)
·
Área
sob a curva de concentração (ASC).
Concentração máxima (maximum
concentration) é o pico da concentração da droga em lugar especificado,
antes da administração de uma segunda dose. Indica-se a concentração máxima
por Cmax.
Cmax =
max { C0, C1, . . ., Ck }
Tempo para atingir a concentração máxima é
o tempo que a droga demora para atingir a concentração máxima. No gráfico, é a
abscissa do ponto que corresponde à concentração máxima. Indica-se por Tmáx.
Na prática, a concentração máxima (Cmax.)
e o tempo para atingir essa concentração (Tmáx ) são obtidos dos dados
coletados.
Exemplo
Veja, na Tabela 2, a concentração máxima e o tempo para atingir a concentração máxima para o exemplo apresentado na Tabela 1.
Cmax = 205,4 mg/mL
Tmáx = 2 horas
Área sob a curva de concentração (area under the concentration curve), que se indica por ASC (em inglês, AUC) é um dos principais parâmetros farmacocinéticos. Existem diversos métodos para estimar a ASC, mas o método dos trapézios (trapezoidal rule) apresentado em seguida, embora seja apenas uma aproximação, é o mais simples.
2.2
Método dos trapézios para obter a ASC até tk
Sejam t0, t1, t2,
…, tk os tempos em que foram tomadas as amostras
de sangue do voluntário e sejam C0, C1, C2,
…, Ck as concentrações da droga medidas no sangue.
Tabela 3
Tempo após
a administração da droga
(em horas)
e concentração da droga no sangue
(em
microgramas por mililitro) de um voluntário
A área sob a curva, que abrange toda a figura – desde a primeira medição feita no tempo (t0) até a última, feita no tempo (tk), é indicada por ASC(0 - tk) e obtida da seguinte maneira:
a) Dos pontos do gráfico, trace
segmentos de reta paralelos à ordenada (eixo dos Y) até a abscissa
(eixo dos X);
b) Observe:
formaram-se um triângulo e vários trapézios. Calcule a área dessas figuras;
c) Some as áreas calculadas para obter a
área sob a curva de concentração (ASC).
Exemplo
Vamos
obter a área sob a curva da concentração (ASC) com os dados do exemplo
já apresentado. Observe a Figura 2, onde foram baixados os segmentos de
reta de cada ponto do gráfico até a abscissa: há primeiro um triângulo e depois
vários trapézios.
A
fórmula para achar a área do triângulo é:
Então
A fórmula para achar a área do trapézio é:
Veja
novamente a curva, refeita na figura abaixo. Temos, sob a curva, cinco
trapézios. Note o primeiro trapézio, apoiado na abscissa com valores entre 1
hora e 2 horas. Esse trapézio foi redesenhado abaixo da curva e depois girado,
para que você mais bem visualize o cálculo da área. Temos:
· a
base maior (em vermelho) é a ordenada da concentração no tempo 2, ou
seja, C2 = 206;
· a
base menor (em azul) é a ordenada da concentração no tempo 1, ou seja, C1 =78;
· a
altura (em preto) é o intervalo de tempo entre 1 e 2 horas. Logo t =1.
Figura
3
Gráfico auxiliar para cálculo da ASC
As áreas, do triângulo e dos demais trapézios, formados por dois tempos consecutivos de coleta e suas respectivas concentrações estão na tabela abaixo.
Tabela 4
Cálculos
auxiliares para obter a ASC
A fórmula para obter a área sob a curva desde zero até o tempo tk é:
4.2 Curva
de concentração da droga de zero até o infinito
Se a concentração da droga em seu lugar de
ação na k-ésima medição (última), que indicamos por Ck for
diferente de zero, pode haver interesse em estimar a área sob a curva de
concentração da droga até a completa eliminação.
Essa área, chamada curva de concentração da droga de zero até o infinito,
é indicada por ASC (0-∞) e pode ser estimada como segue:
em
que Ck é a k-ésima medida (última) de
concentração da droga em seu lugar de ação e lambda (λ) é
a taxa de eliminação constante
da droga.
Para estimar taxa de eliminação constante da droga, que indicamos por l
(lambda), é preciso pressupor que a concentração medida nos quatro (ou seis, se
houver) últimos tempos decresce segundo uma exponencial, isto é, segundo a
curva:
Exemplo
A
exponencial ajustada aos quatro últimos pares de dados do exemplo é
Ŷ = 596,19
e-0,7298t
Tabela 5
Concentração da droga nos s quatro últimos
tempos
de medição
Figura
4
Exponencial
ajustada à concentração da droga nos quatro últimos tempos de medição
A taxa de eliminação constante da droga é λ
= 0,7298 e a área sob a
curva de concentração da droga
de zero até o infinito
é:
Se a concentração da droga no sangue for grande no instante tk, que
é o momento da última medição da concentração da droga no sangue (ou na urina),
a área de tk ao infinito pode ser relativamente grande. Isto não é
aceitável. De acordo com a legislação brasileira, a área sob a curva do
tempo zero ao tempo tk deve ser igual ou superior a 80% da área sob a curva de
zero a infinito.
Em geral, a preocupação é com a extensão da absorção (ou seja, com a
fração da quantidade administrada que chega à corrente sanguínea). Essa é a
dose efetiva da droga, quase sempre menor do que a quantidade administrada. Em
casos agudos, porém, a velocidade da absorção também preocupa.
Referências
1. Conceitos
de farmacocinética constam nos itens II. 2 - e, f da Resolução 251/97-CNS/MS
(inciso II. 1).
2. Veja a
Resolução nº 896 da ANVISA, de 29 de maio de 2003.
3. CHOW, S. C., LIU, J.L. Design and analysis of
bioavailability and bioequivalence studies. New York: Marcel Dekker, 2000.
4.Medical-dictionary.thefreedictionary.com/maximum.Maximum
concentration | definition