As doenças
degenerativas provocam a degeneração de todo o organismo. A artrite
reumatóide (AR), também conhecida como reumatismo deformante, é uma delas. Mas os médicos tendem a
cuidar do paciente e esquecer o impacto da doença na família.
O artigo Family
Matters: The impact of RA on the partners and family members[1] apresentado aqui resumidamente é
importante porque chama a atenção para um ponto que os médicos esquecem: não se
pode considerar a pessoa que tem artrite
reumatóide isoladamente. É preciso olhar seu entorno, sua família, seu
trabalho, seus amigos.
Clare Jacklin, Diretora dos Negócios Externos da National Rheumatoid Arthritis Society (NRAS), uma associação britânica de pessoas que têm artrite reumatóide e seus familiares, reunia-se rotineiramente com centenas de pessoas e sempre se surpreendia com o estoicismo dos doentes e se afligia pelo fato de eles se sentirem extremamente isolados. Terminadas as reuniões, maridos, mulheres, mães, filhas e filhos de pessoas que têm artrite reumatóide chegavam até Jacklin com perguntas que nunca tinham tido a oportunidade de fazer. Ela fez então uma reunião para familiares.
Compareceram 20 famílias, notadamente maridos, o que se explica porque a doença acomete três vezes mais mulheres do que homens. Diz Jacklin que a raiva na sala era notória. Muitos familiares de pessoas que têm artrite reumatóide se sentiam frustrados. Outros sentiam culpa pelo fato de não serem capazes de aliviar o sofrimento da pessoa que amavam. Alguns consideravam necessário proteger o companheiro (a) e esconder dele (dela) o que sentiam. Dessa e outras reuniões ficou claro que a artrite reumatóide tem impacto significante sobre a família. Jacklin fez a pesquisa para medir a extensão desse impacto.
Metodologia
Os dados foram levantados e analisados entre Outubro de 2011 e Março de 2012. No primeiro estágio do trabalho, foram feitas entrevistas semi estruturadas por telefone, para esclarecer o trabalho de pesquisa e levantar os tipos de questões que poderiam ser feitas. No segundo estágio, o questionário foi elaborado, distribuído, coletado e analisado. No terceiro estágio, foram feitas entrevistas em profundidade com oito pessoas.
Achados do questionário
Foram recebidos 392 questionários de familiares com respostas válidas, conforme a distribuição mostrada na Figura 1.
Impactos da artrite reumatóide em companheiros de pessoas com a doença
Impacto financeiro: 57% relataram efeito negativo ou muito negativo na renda familiar.
Impacto na vida social: 60% dos respondentes consideraram que a artrite reumatóide do parceiro restringiu a vida social, uma vez que eles têm de ajudar em cuidados pessoais do outro.
Impacto na vida doméstica: 92% dos respondentes relataram mudanças em suas responsabilidades nas tarefas da casa, com 46% relatando mudanças significativas.
Impacto em seu humor: 93% dos respondentes relataram que a artrite reumatóide do companheiro tinha efeito sobre o próprio humor, incluindo 22% que disseram ser isso freqüente e 13% que disseram isso ocorrer a maior parte do tempo.
Impacto no relacionamento: 43% dos respondentes disseram ter tido dificuldades em seus relacionamentos como resultado da artrite reumatóide do parceiro; 67% relataram que a vida sexual foi negativamente afetada. No entanto, 32% disseram que a doença do parceiro os aproximou.
Impacto em filhos adultos de pessoas com artrite reumatóide
83% das pessoas que têm um dos pais com RA relataram que esse fato afetou sua própria vida como adulto. Desses, 85% disseram ter preocupação com o pai ou mãe doente, 44% relataram ter feito diferentes escolhas sobre sua própria saúde e estilo de vida e 35% disseram que o fato de ter pai ou mãe com artrite reumatóide foi fator decisivo para a escolha de onde morar ou trabalhar.
Respondentes que tinham menos de 18 anos por ocasião do diagnóstico de artrite reumatóide em um dos pais lembraram o impacto da doença na infância: estavam sempre conscientes de que um de seus pais era doente (60%); ficavam amedrontados ou ansiosos (59%); estavam sempre conscientes de que havia coisas que não podiam fazer porque um de seus pais tinha artrite reumatóide.
Impacto da artrite reumatóide em pais de pessoas com a doença
Pais de pessoas com artrite reumatóide mostraram grande variação nas respostas, mas, em geral, disseram sentir-se sobrecarregados. Eles relataram ansiedade intensa, estresse e incerteza sobre o futuro desses filhos. Afirmaram sentir o impacto emocional da doença em toda a família. Pais de filhos adultos ajudam os próprios filhos e as famílias dos filhos, mas sentem que isso é muito pesado. Pais de crianças com artrite reumatóide juvenil contam o impacto dessa doença nos outros filhos e relatam ressentimento e culpa.
Pesquisa qualitativa
Algumas preocupações foram relatadas por todas as oito pessoas que aceitaram colaborar e fazer as entrevistas em profundidade:
- Falta entendimento das pessoas sobre artrite reumatóide, o que pode tornar ainda mais difícil a vida de quem tem de lidar com a doença.
- A comunicação dos profissionais de saúde com a família é vital – embora os homens sejam menos dispostos a falar do que as mulheres. No entanto, todos consideram que a pessoa que tem artrite reumatóide não pode ser tratada isoladamente.
Quatro entrevistados falaram sobre suas vidas depois de o companheiro ter tido o diagnóstico de artrite reumatóide. Relataram:
- Aumento de responsabilidades em casa;
- Tristeza porque a artrite reumatóide do parceiro restringiu sua própria vida;
- Dificuldade em lidar com as emoções;
- Sentimento de culpa por se preocupar com as próprias necessidades;
- Maior aptidão para sentir prazer nas pequenas coisas;
- Gratidão pela ajuda de pessoas que não eram da família.
Pais explicaram como suas crianças pequenas ficam zangadas pelo fato de eles não estarem bem e como é difícil testemunhar a ansiedade de filhos mais velhos.
Filhos de pais com artrite reumatóide disseram que é difícil ver o sofrimento do pai/da mãe no dia a dia, que sentem ansiedade ao saber de novos tratamentos e que sofreram o impacto da doença na tomada de decisão nas próprias vidas.
1.]Survey 2012 - National Rheumatoid Arthritis Society http://www.google.com.br/#sclient=psy-ab&hl=pt- Acesso em junho de 2012.